Na CCJ, Zambelli e aliados tentam desacreditar hacker que invadiu CNJ

AGÊNCIA BRASIL

Para tentar salvar o mandato, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e aliados tentaram, nesta quarta-feira (10), desacreditar o hacker Walter Delgatti Netto em sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, que analisa a cassação da parlamentar.  

Delgatti foi condenado e preso pela invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Na invasão do dia 4 de janeiro de 2023, o hacker incluiu um pedido de prisão falso contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

a deputada Zambelli foi condenada a 10 anos de prisão como mandante do crime que teve o objetivo, segundo a sentença, de desacreditar a segurança do Judiciário e reforçar a versão, sem provas, de fraude na eleição de 2022. A urna, ao contrário do sistema do Judiciário, que não tem ligação com a internet, não podendo ser acessada à distância.

Para parlamentares que defendem a cassação imediata da Carla Zambelli, a oitiva de testemunhas na CCJ é uma manobra para atrasar a cassação da parlamentar. Não há prazo para finalizar a análise desse processo na CCJ.

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O relator, deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), reconheceu a possibilidade de pedir a íntegra dos autos do processo, como querem os colegas de partido de Zambelli, o que pode atrasar o desfecho da análise na CCJ.

A Constituição diz que deputados condenados em transito em julgado, como a Zambelli, devem perder o mandato. A perda, porém, deve ser confirmada pela Câmara.  

Delgatti ficou conhecido como hacker de Araraquara (SP) por ter invadido o celular de autoridades envolvidas na operação Lava Jato, ação que deu origem à Vaza Jato, série de reportagens que indicaram irregularidades da operação.  

O hacker chegou a ser preso na Operação Spoofing da Polícia Federal (PF), em 2019. Ele conta que conheceu a Zambelli, em agosto de 2022. Em seguida, em troca de uma promessa de empreso, Zambelli teria pedido para ele invadir os sistemas do Poder Judiciário, o que a parlamentar nega.

Carla e Delgatti

Presa na Itália e enfrentando um processo de extradição por ser foragida da Justiça brasileira, Zambelli participou da CCJ por videoconferência e sugeriu que o hacker Walter Delgatti Netto seria um mentiroso.

“O senhor disse que foi cinco vezes ao Ministério da Defesa e aí o ministro da Defesa te desmentiu, dizendo que nem te recebeu. Assim, ou a gente acredita em um hacker ou no ministro da Defesa, um general de quatro estrelas”, destacou Zambelli.

“Ambos são réus, né?”, retrucou Delgatti. O ex-ministro da Defesa do governo Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira, é réu por tentativa de golpe de Estado no STF.

Delgatti sustenta que orientou os técnicos da pasta da Defesa na formulação de relatório que tentaria desacreditar a segurança das urnas eletrônica. O general Paulo Sérgio Nogueira nega as acusações.

Ainda na sessão da CCJ, Zambelli negou que o hacker tivesse morado alguns dias na sua casa, insistindo que ele seria um mentiroso.

“Você diz que ficou 15 dias na minha casa. Eu estou dizendo que você passou algumas horas lá. E aí acredita quem quiser acreditar em mim, acredita, quem quiser acreditar em você, acredita”, afirmou a parlamentar presa.

“Ou então [acredita] nas câmeras, pois em seu apartamento tem câmeras”, rebateu Delgatti.

Aliados de Zambelli na CCJ lembraram que, na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) sobre o 8 de janeiro, o hacker negou que tivesse morado na casa da deputada. Delgatti explicou que, na CPMI, entendeu errado a pergunta, mas que ficou lá por 14 a 20 dias. 

A defesa de Zambelli alega supostas contradições nos depoimentos de Delgatti, mas o hacker sustentou que as contradições são referentes apenas a datas, mas não das versões.

“Essa mudança que a defesa alega é a questão de datas, porque eu estou preso e quando eu fui ouvido, fica muito confuso para mim. Às vezes eu confundo agosto com setembro, mas são apenas datas. Não houve mudança de versões”, disse.

Abuso de prerrogativa

Na avaliação da deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), as oitivas marcadas na CCJ são um “abuso de prerrogativa” da parlamentar foragida e que a cassação deveria ser definida por ofício do presidente da Câmara.

“Ela foi condenada por orquestrar, manipular, orientar e organizar, junto com o hacker, a tentativa de invasão do sistema eleitoral brasileiro, do sistema judicial brasileiro, para deslegitimar as urnas eletrônicas e para deslegitimar o Judiciário, para criar a narrativa do golpe”, sustentou.

Já o líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), sustentou que a Carla Zambelli é “perseguida” política e que eles vão lutar para impedir a cassação da parlamentar.

“Carla Zambelli representa 1 milhão de pessoas. Uma mulher não pode ser cassada por uma pessoa desqualificada como acabamos de ver”, disse, se referindo ao hacker Walter Delgatti Neto.

Provas materiais

Outro questionamento repetido por aliados da deputada na Câmara foi se o hacker tinha “provas materiais” de que Zambelli teria mandado ele invadir o sistema do CNJ.

Delgatti explicou que, todas as noites, apagava todas as mensagens porque estava proibido pela Justiça de acessar a internet, mas disse que a Polícia Federal (PF) teria encontrado essas provas no celular apreendido da Zambelli.

Alvarás de justiça

A deputada foragida também sustentou que foi condenada a 10 anos de prisão por causa de 15 alvarás de soltura de criminosos que Delgatti reconhece que ela não solicitou a inclusão desses alvarás.

“É por causa disso que eu estou respondendo a 10 anos de prisão. Porque se fosse só uma, se fosse só o mandado de prisão do Alexandre de Moraes, eu estaria respondendo alguns meses de prisão”, afirmou Carla Zambelli.

Delgatti também questionou essa afirmação.

“Vossa Excelência está desinformada. A pena de 10 anos não é devido a esses alvarás. A pena foi majorada porque o crime era continuado, que, com ou sem eles [os alvarás de soltura], seria majorada,” disse Delgatti.

O hacker argumentou que ele criou um robô no sistema para testar a emissão do pedido de prisão de Alexandre de Moraes e esse robô acabou emitindo esses alvarás, mas que não houve comunicação para as Varas Judiciais responsáveis, não gerando soltura de criminosos.

“Ele ficou meio que descontrolado e emitiu esses alvarás. Eu deixei esse robô lá porque, antes de emitir a ordem de prisão, eu tive que fazer alguns testes. Eu não ia, de forma amadora, tentar emitir uma ordem de prisão sem testar”, disse o hacker.

Pedofilia

Aliados da deputada Zambelli tentaram associar ele à vídeos de pedofilia encontrados pela PF em um dos seus computadores. Delgatti, por sua vez, rebateu que a PF reconheceu que ele nunca abriu esses vídeos e eles devem ter sido extraídos de dados de outros hackers.

“Eu invadi computadores de outros hackers porque eu podia aprender com eles para invadir sistemas. Só que alguns hackers usam vídeos de pedofilia para extorquir pessoas, infectando o computador deles com esses vídeos e ameaçando denunciar a polícia. Eu jamais abri nenhum desses vídeos”, explicou Delgatti.